sábado, 21 de outubro de 2017

A Mulher no Espelho



A Mulher no Espelho - Virgínia Woolf

Quem é Isabela? Qual é a verdade que a circunda? No conto A mulher no espelho, Woolf utiliza-se de uma narrativa em terceira pessoa para nos apresentar a sua personagem à partir da perspectiva dada pelos pensamentos e reflexões do(s) narrador(es). Assim, durante o relato, até o final da história, apenas pré conceitos e fatos sobre a vida misteriosa dessa senhora peculiar nos são impelidos, suscitando dúvidas e mais dúvidas superficiais à seu respeito. Afinal, quem era ela?

Essa mulher rica, de vestimentas chiques e da moda, com uma vida preenchida por viagens exóticas, nas quais adquirira a maior parte de seus bens e móveis; com armários e gavetas cheios das mais diversas cartas amorosas e de relacionamentos passados, simplesmente só poderia emanar essa concepção de alma tão procurada, conhecida como felicidade. Entretanto, pouco a pouco, o espelho muda tais olhares.

Isabela Tyson caminha vagarosamente do jardim em direção a mesa de sua sala de estar, na qual recentemente um agente deixara a correspondência sobre. Um ajeitar de mãos e flores, um movimento do corpo, logo ela se encontra parada em frente a este impiedoso objeto. Aqui, olhando para si mesma na imagem refletida pelo espelho, todas as “máscaras” e “materialidades” que a definiam, tais como o vestido verde-acizentado, não possuem valor e são expelidos. Ela era vazia. Desse modo, conclui-se a verdade (que muitos queriam descobrir sobre a personagem) com ironia - “As pessoas não deviam dependurar espelhos em suas salas.”



Citação:

"Afinal, ei-la ali, no salão. Deteve-se. Ela parou em pé junto à mesa. Ela parou completamente imóvel. De imediato o espelho começou a verter sobre ela uma luz que parecia pregá-la; que parecia um ácido que corrói o não-essencial e o superficial e deixa apenas a verdade. Era um espetáculo encantador. Tudo imanava de Isabela - nuvens, vestidos, cesto, diamante -, tudo o que fora chamado de planta rasteira e convólvulo. Eis a dura parede embaixo. Eis a própria mulher. Ela se erguia nua naquela luz impiedosa. E nada havia. Isabela estava completamente vazia. Não tinha pensamentos. Não tinha amigos. Não cuidava de ninguém. Quanto às cartas, eram todas contas. E enquanto ali estava, velha e angulosa, jaspeada e coberta de rugas, com o seu nariz arrebitado e o pescoço vincado, ela sequer se deu ao trabalho de abri-las."


Curiosidades:
Entre suas obras mais conhecidas, se encontram Mrs. Dalloway, Orlando e Um Teto Todo Seu, no qual este último possuiu uma de suas mais lembradas frases - "Uma mulher deve ter dinheiro e um teto todo seu se ela quiser escrever ficção 

Virgínia Woolf foi e é ainda muito aclamada pelo seu trabalho em descrever a alma feminina

Durante sua vida, passou por diversas crises e lapsos de loucura, entre os quais tentou cometer suicídio aos vinte e dois anos, mas foi da janela do segundo andar e por isso não se feriu gravemente.

Em 1941, aos 59 anos, por diversos fatores, incluindo o agravamento de sua depressão e a explosão da Segunda Guerra Mundial, Virgínia consuma o suicídio ao pular no rio Ouse com pedras dentro de seus bolsos.


Avaliação:  

É genial como Woolf consegue, a partir da escolha de seu(s) narrador(es) e des breves comentários dúbios, nos fazer tão loucamente curiosos a descobrir mais sobre a vida intrigante da personagem. Para, no fim, mesmo que liricamente, desnude-a e vilmente mostre a solidão humana. 


segunda-feira, 16 de outubro de 2017

No caminho de Swann




No caminho de Swann - Proust

O francês Marcel Proust (Auteuil, 10/07/1871 – Paris, 18/09/1922), proveniente de família abastada, era filho do médico Adrien Proust, professor e inspetor de saúde, e de Jeanne Weil; sofreu a vida toda devido à asma, e devido a isso, desde cedo foi um leitor voraz, o que o ajudou a ser tonar um grande escritor. Passou, após a morte de sua mãe, 10 anos de sua vida trancado dentro de um apartamento, tendo escrito até um dia antes de sua morte. Autor das obras: Os prazeres e os dias (ensaios), Jean Santevil, da serie Em Busca do Tempo Perdido e de diversas crônicas.
Em Busca do Tempo Perdido é uma série de livros que conta a história de vida Marcel-Personagem (utilizo do –Personagem devido aos livros serem quase autobriograficos e para que possamos distinguir autor de personagem, mas daqui em diante vamos nos referir ao personagem como Marcel e ao escritor como Proust). O primeiro, O caminho de Swann,  livro trará da infância do narrador-personagem na cidade de Combray. Ele relembra, inicialmente, a sua relação, quase obsessiva, com sua mãe: onde ele esperava ansiosamente pelo beijo de boa noite proveniente dela, pois ele não podia participar do jantar ou permanecer com a família muito tempo, independe de o beijo ser dado antes ou depois de ele se retirar para o quarto Marcel ficava frustrado e deprimido. Então, Proust entra com o personagem que está presente no titulo do livro Swann: para Marcel, Swann era o grande culpado, pois ele chegava a casa e a mãe de Marcel não ia dar-lhe o beijo de boa noite. A família de Marcel, quando estava em Combray, tinha o costume de passear pela cidade, e podiam escolher entre dois caminhos: o mais longo, de Guermantes, que seguia o rio; e o mais curto, de Méséglise, que passava nas terras de Swann. Esses caminhos, ao decorrer da história, podem ser entendidos como opções de vida. Em determinada parte do livro, conhecemos mais de perto Swann: um burguês, ocioso, solteiro e apreciador das artes, que tem sua vida mudada por uma mulher, a qual ele se apaixona e, posteriormente, casa, Odette (uma mulher com fama na cidade e um caráter questionável). Nem mesmo Swann entende como se apaixona por essa mulher, no final ele acaba recebendo uma carta anônima que o informa sobre as traições da mulher.

Citação

(…) desde que amava Odette, simpatizar com ela, tentar ter uma só alma dos dois, era- lhe tão agradável que procurava comprazer- se nas coisas de que ela gostava, e sentia um prazer um tanto mais profundo, não apenas em imitar os seus hábitos, como ainda em adotar opiniões (…) (p. 261)

Curiosidades

  • Proust inaugura uma espécie de literatura de memória involuntária ao escrever Em Busca do Tempo Perdido;
  • Por ser muito meticuloso, Proust escreveu, primeiramente, o inicio e o final da série de livros, para depois a transformar nos 7 livros que existem hoje;
  • Ele morreu rescrevendo  A prisioneira, sem ter revisado os últimos dois livros da série;
  • Proust era homossexual assumido, apesar de seu personagem Marcel ser heterossexual;


Avaliação


Proust nos mostra, além de sua vida, uma história que nos leva e nos faz pensar como a vida é e como o tempo passa sem que percebamos; com Em Busca do Tempo Perdido, ele nos faz perceber que todos os momentos que passamos não podem ser retornados, mas que há um jeito de os eternizarmos: escrevendo-os.

domingo, 15 de outubro de 2017

Madame Bovary


Madame Bovary - Gustave Flaubert

 

Madame Bovary é um romance realista escrito por Gustave Flaubert, publicado em 1857. É tido como um marco do universo literário, seja pelo seu estilo - marcado por dedicada descrição de lugares, acontecimentos e comportamento humano -, seja pelo burburinho causado na época de sua publicação.

A história conta a vida em matrimônio de Charles e Emma Bovary; aquele tem sua juventude relatada nos primeiros momentos do livro, algumas das agruras e situações que de certa forma parecem apresentar ao leitor um protótipo do personagem que mais tarde terá dificuldades em sanar os anseios da mulher e compreender o que de fato se passava na mente - e vida íntima - dela.

Após a biografia de Charles, o romance se volta para Emma Bovary, que passa então a ser a personagem central da trama. Ao longo da narrativa, é magistralmente relatado por Flaubert a vida de Emma, a sua educação no convento (onde acabará sendo instigada a ler romances, que sugestivamente influenciarão algumas de suas ideias, desejos e decepções após o casamento), seus primeiros contatos com Charles e até os pormenores do cenário em que ocorrem as tentativas de realização dessa mulher.

O primeiro encontro entre Charles e Emma acontece quando ele vai consultar o Sr. Rouault. Encantado com a filha do paciente, o médico apaixona-se por Emma. Ainda casado com Heloise Dubuc, a província de Rouen só vê o matrimônio entre Charles e Emma se concretizar após a morte da primeira mulher do médico.

O primeiro grande choque que Emma sente, que a levou a refletir sobre o estado em que se encontrava o casamento com Charles - "pondo na balança", possivelmente, as imagens antes sonhadas das leituras de romances e a vida "pacata' que realmente vivia - ocorre após o baile no Château La Vaubyessard, a convite do Marquês d'Andervilliers; a partir daí, a convivência em meio à aristocracia francesa e o modo de vida burguês passam a ser estimados por Emma, em oposição a vida que leva com Charles, considerada infeliz.

Ao se mudar para Yonville, a maternidade de Emma e sua insatisfação após o nascimento de Berthe não parecem realizar suas aspirações - em dado episódio, trata mal a filha, chamando-a de "feia". Nessa cidade Emma conhece Léon, estudante de Direito; surge uma paixão entre eles, que Emma rechaça - mesmo havendo uma profusão de sentimentos e acontecimentos iguais aos dos romances lidos por Emma no convento, tão sonhados por ela. Outro amante de Emma na história é Rodolphe, um aparente burguês proprietário de terras que procura os serviços médicos de Charles. Emma e Rodolphe têm um longo caso amoroso - alguns encontros acontecendo nos próprios aposentos de Charles. Entre cartas e juras de amor, Emma propõe a fuga dos dois, plano logo repelido por Rodolphe.

Emma, angustiada em sua procura infinda pela vida romântica, tal como vista nas leituras, procura refúgio na religião; porém, atribulando ainda mais seus pensamentos, Léon retorna de viagem, e a encontra na ópera - entretenimento proposto por Charles. Entre idas e vindas de encontros secretos, Emma começa a deixar Léon insatisfeito, pois o dispêndio de fortunas e o crescente aviltamento dela torna-se insustentável. De fato, ao longo desse periodo, Emma parece mergulhar em tentativas desesperadas de igualar-se a personagens dos romances lidos. A religião, o consumo, e as tentativas de se adequar ao espírito romântico não bastaram em sua sede de felicidade. 

A decadência moral de Emma é completa ao gastar a fortuna de Charles, chegando mesmo a frequentar um prostíbulo em busca de homens que lhe forneçam dinheiro. Léon e Rodolphe a abandonam; Charles, falido, vê sua esposa se suicidar ao ingerir arsênio. As cartas de amor que Emma trocara com os amantes são encontradas, tornando ainda mais intenso o desgosto de Charles. Após a morte, a filha do casal Bovary, Berthe, vai morar com a avó, que logo morre. Dada aos cuidados de uma tia, é inserida no mundo proletário, trabalhando com fiação de algodão.

Citação:

O dever é sentir aquilo que é grande, amar o que é belo e não aceitar todas as convenções da sociedade, com as ignomínias que ela nos impõe(p. 136)



Curiosidades:

  • Gustave Flaubert foi amigo de Baudelaire, Zola, dentre outros escritores e artistas plásticos.
  • Flaubert se considerava um autor romântico; não gostava de ser chamado de "escritor realista".
  • Durante a vida, devido a epilepsia, chegou a passar 14 horas escrevendo.
  • A obra Madame Bovary foi julgada, sendo vista como apologia à imoralidade. Flaubert, defendendo-se, disse ser a obra uma crítica aos maus costumes da sociedade francesa .


Avaliação:

A leitura de Madame Bovary - principalmente durante a primeira parte - pode parecer maçante para leitores que preferem uma exposição mais direta do tema da narrativa; mas é justamente essa peculiaridade da obra (a riqueza de detalhes e descrição dos fatos) que torna o enredo bem construído, possibilitando a quem lê acompanhar passo a passo o desenrolar da vida de Emma Bovary.



sábado, 14 de outubro de 2017

As Flores do Mal


As Flores do Mal - Charles Baudelaire

 

As Flores do Mal, de autoria do francês Charles Baudelaire, é um marco da produção poética do artista. Publicado pela primeira vez em 1857, a obra (Ed. especial. - Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2012) reúne 163 poemas, separados em 6 seções (De Spleen et idéal, De Tableaux parisiens, Le Vin, De Fleurs du mal, Révolte e La Mort), tendo como prólogo o poema intitulado "Ao Leitor".

Os poemas mostram um poeta ciente da época em que vive, parecendo retratá-la de maneira surrealista em alguns momentos, manifestando suas considerações, emoções e, notavelmente, a vanguarda de sua produção poética. De fato, a obra de Baudelaire foi censurada por diversas vezes, supondo o choque de sua visão artística com a mentalidade crítica da época, fato que não impediu seu posterior reconhecimento literário e sua influência poética nos artistas subsequentes.


Citação:

O albatroz

Às vezes, por prazer, os homens da equipagem
Pegam um albatroz, imensa ave dos mares,
Que acompanha, indolente parceiro de viagem,
O navio a singrar por glaucos patamares.

Tão logo o estendem sobre as tábuas do convés,
O monarca do azul, canhestro e envergonhado,
Deixa pender, qual par de remos junto aos pés,
As asas em que fulge um branco imaculado.

Antes tão belo, como é feio na desgraça
Esse viajante agora flácido e acanhado!
Um, com o cachimbo, lhe enche o bico de fumaça,
Outro, a coxear, imita o enfermo outrora alado!

O Poeta se compara ao príncipe da altura
Que enfrenta os vendavais e ri da seta no ar;
Exilado no chão, em meio à turba obscura,
As asas de gigante impedem-no de andar.

__________________________________

A uma passante

A rua em torno era um frenético alarido.
Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão suntuosa
Erguendo e sacudindo a barra do vestido.

Pernas de estátua, era-lhe a imagem nobre e fina.
Qual bizarro basbaque, afoito eu lhe bebia
No olhar, céu lívido onde aflora a ventania,
A doçura que envolve e o prazer que assassina.

Que luz... e a noite após! — Efêmera beldade
Cujos olhos me fazem nascer outra vez,
Não mais hei de te ver senão na eternidade?

Longe daqui! tarde demais! nunca talvez!
Pois de ti já me fui, de mim tu já fugiste,

Tu que eu teria amado, ó tu que bem o viste!


Curiosidades:

  • Charles-Pierre Baudelaire (1821-1867) nasce e morre em Paris, tendo aos 6 anos de idade perdido o pai; passando a viver com sua mãe e seu padrasto, a relação com esse é rompida devido à decisão de Baudelaire em se dedicar às letras;
  • Assim como Madame Bovary, a coleção de As Flores do Mal causou polêmica, e foi censurada diversas vezes por "insultar a moral pública";
  • Aku no Hana é o nome de um mangá publicado de 2009 à 2014 e de um anime que foi ao ar em 2013. Tem como protagonista um estudante chamado Takao Kasuga, amante da literatura cujo livro favorito é As Flores do Mal.


Avaliação:

A leitura de As Flores do Mal é bastante intuitiva, sendo possível acompanhar e desvendar o pensamento do poeta Baudelaire de acordo com a evolução dos versos. Isso provoca um estado de identificação entre o leitor e a obra, que transmite o valor por trás de cada poesia.


Bibliografia: As flores do mal / Charles Baudelaire ; apresentação Marcelo
Jacques ; tradução, introdução e notas Ivan Junqueira. - [Ed.
especial]. - Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2012.